Artigo de pesquisa da UCS é publicado pela Scientific Reports, do Nature Publishing Group.

Assessoria de Comunicação da Universidade de Caxias do Sul - 20/06/2017 | Editado em 22/02/2024

Pela primeira vez um trabalho produzido na UCS figura em uma das principais editoras científicas do mundo.  Estudo revela, em nanoescala, como o atrito entre materiais provoca dissipação de energia. Descoberta indica como indústrias metal e eletromecânica podem obter maior eficiência energética.

Conduzida pelo professor Carlos Figueroa, pesquisa no Laboratório de Caracterização de Superfícies em Nanoescala contou com suporte das bolsistas Saron Rosy Sales de Mello, acadêmica de Engenharia Química; Caren Machado Menezes, que apresentou tese de doutorado a respeito; e Carla Daniela Boeira, então mestranda e agora doutoranda em Engenharia e Ciência dos Materiais.

Visando responder a uma das mais importantes demandas industriais da atualidade – como obter maior eficiência energética de máquinas mecânicas e eletromecânicas – uma pesquisa desenvolvida por uma equipe do Programa de Pós-Graduação em Engenharia e Ciência dos Materiais colocou, pela primeira vez, um trabalho produzido na Universidade de Caxias do Sul nas páginas de uma das mais importantes publicações científicas do mundo.

A Scientific Reports, revista de acesso aberto online, integrante do Nature Publishing Group, que reúne as publicações da mais conceituada editora científica internacional, a Springer Nature, publicou, na última semana, artigo resultante de pesquisa conduzida pelo professor doutor em Física da UCS, Carlos Figueroa, que trouxe novas evidências para explicar, em nanoescala (1 nanometro = 1 milímetro dividido por 1 milhão), como ocorre a dissipação energética através do atrito mediante vibrações atômicas, quando há contato direto entre materiais.

“Em algumas situações o atrito é bom, como nos freios. É preciso atrito para a frenagem funcionar. Em outros, pode ser ruim, o que é o caso dos sistemas que envolvam transferência de movimento entre engrenagens, eixos, polias, existentes em praticamente todas as máquinas mecânicas e eletromecânicas”, observa o professor. “Quando existe atrito, perde-se parte da energia empregada para gerar o movimento. Na medida que sabemos como os mecanismos de dissipação dessa energia funcionam, podemos processar os materiais para que eles tenham o menor coeficiente de atrito possível”, esclarece.

A constatação da pesquisa, portanto, abre caminho para que se possam desenvolver motores, turbinas, hélices ou qualquer outro sistema que envolva transmissão de movimento, mais eficientes energeticamente. Ou seja, capazes de poupar milhões em custos com combustíveis, energia elétrica ou outras fontes de alimentação, além, é claro, dos próprios recursos naturais.

Fronteira do conhecimento
A pesquisa conduzida pela equipe da UCS se propôs a confirmar se uma das leis da física quântica, a da dissipação fonônica (que trata da vibração coletiva dos átomos) poderia se confirmar no caso do contato direto entre os materiais. “Empiricamente, foi-se aprendendo o que fazer para diminuir o atrito entre materiais. Mas ainda não está clara a origem, dentro das leis da Física, dos mecanismos da dissipação de energia envolvidos no fenômeno do atrito. Estávamos em uma fronteira do conhecimento sobre a qual havia posições conflitantes no meio científico, e acredito que este trabalho vem fechar essa discussão”, relata Figueroa.

Este fechamento se refere ao passo adiante dado com o estudo, que gerou o artigo publicado na Scientific Reports. A bibliografia internacional, até então, tinha registro apenas de pesquisas realizadas na superfície dos materiais, por meio de um sistema chamado Microscopia de Força Atômica (AFM, na sigla em inglês). Estes experimentos constataram que o atrito provoca vibrações atômicas, gerando a dissipação de energia pela propagação da onda vibratória (fônons) na rede de átomos (a ‘dissipação fonônica’). Quanto maior a frequência de vibração, maior a dissipação de energia. Desta maneira, por exemplo, quanto mais atrito houver entre duas peças de uma engrenagem, mais será dispendido combustível para movimentar o mecanismo.

Nova evidência científica
As observações com AFM, contudo, só haviam medido o atrito na superfície mais externa dos materiais. O trabalho da UCS acrescentou a investigação por contato direto. Por meio de um NanoTribômetro, equipamento disponível no Laboratório de Caracterização de Superfícies em Nanoescala da Universidade, Figueroa determinou uma penetração de 100 nanometros, com uma ponta de diamante, no volume de amostras de carbono amorfo (sem forma organizada em nível atômico) com acréscimo de hidrogênio e/ou deutério.

As medições do atrito gerado pelo deslizamento da ponta na amostra comprovaram que as vibrações das redes de átomos ‘dentro’ do material ocorrem no mesmo padrão verificado nas análises de superfície feitas por AFM. “Nossos resultados foram compatíveis com os já publicados: existe contribuição fonônica no coeficiente de atrito em nanoescala. Mas acrescentamos uma nova evidência. Confirmamos que isso acontece também por contato direto. Na superfície ou no volume do material, a dissipação do atrito ocorre do mesmo jeito”, sustenta o professor.

Mais eficiência e economia
De acordo com Figueroa, a compreensão sobre como ocorre o atrito a partir das propriedades fundamentais da matéria permite que se planejem materiais e se projetem mecanismos buscando-se uma maior eficiência energética. “Pode-se modificar o material, agregando, tirando ou combinando elementos, para conseguir uma vibração fonônica menor, o que vai dissipar menos energia”, aponta.

Como exemplos, o professor cita o beneficiamento tanto dos processos industriais metalmecânicos e eletromecânicos, com o desenvolvimento de maquinário mais eficiente, como dos produtos destes segmentos. “As aplicações envolvem todo tipo de mecanismo de transferência de movimento, envolvendo máquinas, carros, aviões, até dispositivos em que a fricção acontece em contato com o ar, como é o caso de hélices ou turbinas, e até com a terra, como o arado de um trator”, salienta. “Processando o material ou criando um revestimento, em todos os casos a redução do atrito resulta em mais eficiência energética”, define.

QUATRO ANOS
O estudo do atrito a nível nanoscópico iniciado na UCS durou quatro anos. Para empreender os experimentos, o professor Carlos Figueroa propôs a participação de grupos de estudos da PUC-RJ e da Unicamp-SP, para a fabricação das amostras de carbono e sua posterior caracterização físico-química, com a adição de hidrogênio e deutério.Em seguida, o trabalho exigiu o estabelecimento dos protocolos de medição. “Precisamos de um ano e meio até entender como medir o coeficiente de atrito em nanoescala sem erros sistemáticos”, conta o professor. Depois disso, passou-se um ano de medições até a obtenção de resultados suficientes para a redação do artigo, executada no ano passado.A pesquisa contou com suporte das bolsistas Saron Rosy Sales de Mello, acadêmica de Engenharia Química; Caren Machado Menezes, que apresentou tese de doutorado a respeito, aprovada no dia 9 de junho; e Carla Daniela Boeira, então mestranda e agora doutoranda em Engenharia e Ciência dos Materiais.Em Janeiro deste ano, o artigo foi submetido à Scientific Reports, que efetivou a publicação em 12 de junho. Com isso, o trabalho passa a integrar a bibliografia internacional referente aos estudos dos Fenômenos do Atrito, dentro da grande área das Propriedades Físicas dos Materiais.

Foto: Claudia Velho