UCS na vanguarda da Ecologia Integral.
‘Somos todos um’ – O jargão sistêmico não é mera frase de efeito. As ciências da Natureza e as Humanas há muito apontam para a mesma acepção das tradições espirituais, confirmando a unidade entre Humanidade, seres vivos e planeta – entendimento primordial para a evitação de um colapso ambiental e a garantia do legado da vida às futuras gerações
Ariel Rossi Griffante – argriffante@ucs.br
No eterno debate entre ciência e religião, pelo menos uma convergência é fundamental: tudo está interconectado. No ramo científico, do ponto de vista concreto da química seres vivos e inanimados partilham elementos atômicos básicos, ao mesmo tempo que a biologia ensina sobre a interdependência dos ecossistemas. Mesmo ciências que transitam pela subjetividade, como a sociologia e a psicologia, constatam a indissociável constituição de indivíduos e grupos das inter-relações ambientais e culturais. As mais diferentes tradições espirituais, por sua vez, têm em comum a premissa da inseparatividade entre humanidade, formas de vida e o planeta enquanto conceituados como criaturas e criação.
Apesar da obviedade advinda de visões capazes de contemplar crédulos e céticos (de qualquer das frentes pela qual se escolha avaliar), ainda vivemos, predominantemente, como se não fosse assim. Segundo o Banco Mundial, mantido o ritmo de consumo atual, se a população global chegar aos 9,6 bilhões de pessoas estimados em 2050, serão necessários recursos três vezes superiores à capacidade da Terra para abastecer a humanidade, acarretando em provável colapso ambiental planetário.
Tal perspectiva fez com que a Unesco (Organização das Nações Unidas para a Educação, a Ciência e a Cultura) incluísse o consumo e a produção responsáveis como um dos 17 Objetivos para o Desenvolvimento Sustentável a serem alcançados até 2030. O propósito é subdividido em quatro metas:
– Reduzir à metade o desperdício mundial de alimentos per capita na venda a varejo
– Alcançar uma gestão sustentável e uso eficiente dos recursos naturais
– Racionalizar os subsídios aos combustíveis fósseis
– Alcançar uma gestão ambientalmente racional dos produtos químicos ao longo de seu ciclo de vida
‘Que necessidade tem de nós esta Terra?’
O apelo pela substituição do estilo de vida consumista por um sustentável também está no cerne da primeira encíclica inteiramente de responsabilidade do Papa Francisco, a Laudato Si (em português Louvado Sejas, subtitulada Sobre o Cuidado da Casa Comum), publicada em 18 de junho de 2015. Pelo documento, a mais alta comunicação papal, o pontífice propõe o conceito de ecologia integral – abarcando as dimensões humana, social e ambiental e sua interdependência – para defender, de modo mais filosófico do que dogmático, a unificação da humanidade contra a degradação ambiental, evidenciada pelas mudanças climáticas.
A partir de indagações como Que tipo de mundo queremos deixar a quem vai suceder-nos? e Que necessidade tem de nós esta Terra?, Francisco estabelece a reflexão sobre a indissociabilidade entre o meio ambiente e o ser humano para propugnar uma ‘conversão ecológica’, em que o cuidado perpassa indivíduos e comunidades até abranger a ‘Casa Comum’.
Campanha da Fraternidade
A Laudato Si e a Conferência do Clima da Organização das Nações Unidas (ONU), realizada em 2015, inspiraram a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) a promover a Campanha da Fraternidade de 2016 de modo ecumênico e sob o tema Casa Comum, nossa responsabilidade. A tradicional mobilização propõe o debate sobre o direito universal ao saneamento básico e por políticas públicas e atitudes responsáveis que garantam a integridade e o futuro do planeta.
Para tanto, defende o consumo responsável, principalmente da água, e o incentivo aos municípios para a elaboração de planos de saneamento. “A responsabilidade pela Casa Comum é de todos, dos governantes e da população. Há que se ter em mente que justiça ambiental é integrante da justiça social”, defende a entidade, na justificativa da campanha.
Conceito orienta atuação do ISAM-UCS
O desenvolvimento sustentável e a ecologia integral propostos pela Unesco e pela encíclica papal estão nos fundamentos da atuação do Instituto de Saneamento Ambiental (ISAM), da Universidade de Caxias do Sul. Tais princípios partem, justamente, da visão de unicidade – e, portanto, interdependência – entre todas as coisas, partilhada pela diretora do instituto, professora Vania Schneider.
“Para a biologia, você é o que come, bebe e respira; a natureza de fora é a mesma de dentro. Portanto, saúde e qualidade de vida são consequências da saúde do ambiente em que o indivíduo vive”, diz a bióloga por formação, com mestrado em Engenharia Civil e doutorado em Engenharia de Recursos Hídricos e Saneamento.
Para a especialista, a defesa das Nações Unidas e da Igreja de, sobretudo, uma mudança comportamental e conceitual – de pessoas, empresas e governos – para fazer frente às alterações climáticas e ao excesso de consumo, passam pela entendimento da humanidade como um dos muitos elementos do meio ambiente – e aquele que mais o impacta. “As consequências quanto ao equilíbrio dos ecossistemas e, assim, da vida como um todo, recaem sobre nós mesmos”, salienta.
Efeitos universais
De tal modo, a emergência da conscientização a respeito também se baseia na característica essencial dos ecossistemas: “Qualquer intervenção no meio ambiente tem efeitos universais”, destaca a professora. A observação encontra amparo em estudos espalhados pelo mundo que, em comum, apontam para o risco real de um colapso ambiental global. A divergência se dá apenas quanto ao prazo: 30 anos para os mais pessimistas, 100 para os menos.
Segundo Vania, o ponto nevrálgico – resultante da exploração excessiva dos recursos naturais e da poluição – seria a escassez hídrica e, por consequência, de alimentos. A saída passa pela compreensão, de cada ente social, da ecologia integral: “Evoluíram a tecnologia e a cultura, mas perdeu-se a concepção ambiental. A ecologia é a ciência do todo, fundamenta a física e a química. O ser humano não está isolado. Você é a natureza”.
Trecho de reportagem publicada na revistaUCS – edição 21 – Leia a reportagem completa
Fotos: Claudia Velho/UCS, arquivo ISAM-UCS e divulgação CNBB