Pesquisador da Universidade de Lisboa realiza atividades na pós-graduação em Educação.
Intercâmbio do professor José Machado Pais na Universidade de Caxias do Sul faz parte das ações voltadas para a internacionalização do Programa de Pós-Graduação em Educação.
Em sua primeira missão acadêmica no Rio Grande do Sul, o professor e pesquisador José Machado Pais, do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, participa de atividades no âmbito do Programa de Pós-Graduação em Educação, entre elas o seminário e minicurso “Educação e Cotidiano: pressupostos Teóricos e Metodológicos”, nos dias 2 e 9 de maio; a Banca de Qualificação do Projeto de Tese de Doutorado de Cineri Fachin Moraes, no dia 3, sobre o “Seminário Integrado no Ensino Médio/RS e as experiências escolares e juvenis: entre rotinas e rupturas do cotidiano, a tentativa de juntar peças”; e a palestra aberta ao público, na noite do dia 2, na qual ele discorreu sobre um dos seus grandes temas de investigação, “Jovens e Transições de Vida”.
O intercâmbio do professor Machado Pais no Rio Grande do Sul – entre os dias 1º e 11 de maio – tem o apoio do CNPq, através do edital de Apoio a Pesquisador Visitante (APV) e prevê, além das atividades na Universidade de Caxias do Sul, atividades na UFRGS com o Programa de Pós-Graduação em Música e com o Grupo de Pesquisa em Educação Musical e Cotidiano.
Além dos encontros com professores e estudantes do Programa de Pós-Graduação em Educação, do Observatório de Educação e do Grupo de Pesquisa Observa, o pesquisador também dedicou parte do seu tempo para conhecer as manifestações culturais de Caxias do Sul e região, como os festejos da Festa do Divino de Criúva, evento religioso e cultural que tem origem nas celebrações religiosas realizadas em Portugal desde o século XIV. Machado Pais é também um investigador na área da Música, especialmente no âmbito das trocas culturais dos países de língua portuguesa.
Internacionalização da pós-graduação
Para a professora Nilda Stecanela, pró-reitora de Pesquisa e Pós-Graduação, que também integra o corpo docente do Programa de Pós-Graduação em Educação, a vinda do professor Machado Pais à Universidade é um sonho antigo e remonta ao período de 2003/2008, período em que realizou seu Doutorado em Educação pela UFRGS, com a tese “Jovens e cotidiano: trânsitos pelas culturas juvenis e pela escola da vida”. Como parte de seu projeto de doutorado, fez estágio no Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa, onde aprofundou, sob a orientação do professor José Machado Pais, os estudos sobre a sociologia da vida cotidiana como perspectiva metodológica.
A participação do professor Machado Pais como membro da Banca de Qualificação do Projeto de Tese de Doutorado de Cineri Fachin Moraes, estudante orientada pela professora Nilda Stecanela, a quem ele já havia orientado em seu estágio de doutorado cerca de dez anos atrás, assim como as demais atividades desenvolvidas no Programa de Pós-Graduação em Educação, foi, sobretudo, uma oportunidade de ativar conexões e compartilhar conhecimentos e experiências, abrindo novas perspectivas de interação e cooperação acadêmica em nível internacional para os demais integrantes do Programa. Desafio que está posto pela CAPES aos programas de pós-graduação stricto sensu em funcionamento no país.
Um etnógrafo urbano, que investiga a sociologia da vida cotidiana
Ao iniciar sua palestra sobre “Jovens e Transições de Vida”, o professor José Machado Pais levou os participantes a uma viagem pela África, trazendo a realidade dos jovens da Guiné Bissau – antiga colônia portuguesa na África Ocidental – como exemplo de uma situação que se reproduz em várias partes do mundo: as dificuldades do jovem contemporâneo em ascender ao mundo adulto e realizar seus sonhos de futuro. Situação em que está presente uma forte tensão entre tradição e modernidade, uma discrepância entre idade cronológica e idade social, e a permanente necessidade do jovem de “comer o mundo”, de mover-se para adiante, de alcançar por seus próprios meios um futuro. Pode ser também uma situação de marginalidade e violência, de falta de opções e insatisfação generalizada, em um mundo em que apenas 1% da população detém 51% da riqueza mundial. “A fuga à marginalidade social passa pela conectividade, que inspira novas formas de participação do jovem, local e globalmente”. Falando a uma plateia predominantemente de professores e estudantes que se preparam para serem sujeitos formadores das novas gerações, o professor Machado Pais falou de redes sociais e da cultura da conectividade, como fatores que dão ao jovem maior acesso à informação e ao debate de ideias. Num mundo em que mais de 60% dos jovens entre 15 e 29 anos mantém uma relação cotidiana com as tecnologias da internet (a “grande teia” que faz com que as palavras possam “voar”) criam-se novas possibilidades de partilhar sonhos e projetos comuns e a escola, conectada com essa realidade, pode atuar como uma plataforma de diálogo, fornecendo os meios para que o jovem possa navegar nesse circuito de socialização com mais segurança, “interconectando o que está desconectado”.
José Machado Pais é um renomado cientista social com trânsito em instituições de ensino e pesquisa de diferente países, com quem compartilha temas e linhas de pesquisa relacionados à Sociologia do Cotidiano, Culturas Juvenis e Cultura Escolar. Economista, com doutorado em Sociologia, é professor e investigador do Instituto de Ciências Sociais da Universidade de Lisboa e membro do Senado da Universidade de Lisboa. É professor visitante em várias universidades europeias e sul-americanas e, no Brasil, atua em parceria com pesquisadores da USP, UFF, UFES, UFMG, UFRGS, entre outras instituições. Já publicou cerca de 40 livros – mais de 20 de autoria individual – entre os quais se destacam: A Prostituição e a Lisboa Boémia (Lisboa, 1985, 2008, 2016); Artes de Amar da Burguesia (Lisboa, 1986, 2006); Culturas Juvenis (Lisboa, 1993, 1995, 2003); Consciência Histórica e Identidade (Oeiras, 1999, 2016); Sousa Martins e suas Memórias Sociais: Sociologia de uma Crença Popular (1994); Sociologia da Vida Quotidiana (Lisboa, 2002, 2004, 2007, 2010, 2012; 2015); Ganchos, Tachos e Biscates. Jovens, Trabalho e Futuro (Porto, 2001, 2003, 2005, 2016); Nos Rastos da Solidão (Porto, 2006, 2007, 2016); Lufa-lufa Quotidiana. Ensaios sobre Cidade, Cultura e Vida Urbana (Lisboa, 2010, 2014); Sexualidade e Afetos Juvenis (Lisboa, 2012); Enredos sexuais, Tradição e Mudança: as Mães, os Zecas e as Sedutoras de Além-mar (Lisboa, 2016).
Na grande teia
Muitos dos artigos e publicações do professor podem ser encontrados na Internet – a grande teia que conecta pessoas e ideias de todos os lugares. Abaixo, transcrevemos trechos de dois artigos, que abordam alguns dos temas de estudo e reflexão de um pesquisador que gosta de deambular, como um “observador clandestino”, um “etnógrafo urbano”, na tentativa de melhor compreender o ser humano e suas trajetórias de vida, na “curva do tempo”. “É deambulando pelo cotidiano que o descobrimos como uma alavanca do conhecimento”.
“Criatividade consiste em conectar o interconectado, vendo outra coisa para além do que parece ser. Portanto, há que descobrir ligações insuspeitas entre o que, à observação, nos é dado em fragmentos e tentar encontrar sentidos. Sentidos ocultos que nos permitem chegar a um nível de entendimento que tende, portanto, ao inter-relacionamento. Não é o que fazemos quando montamos um puzzle? Num ou noutro caso o que prevalece é uma lógica de combinação assente em estratégias de collage. Infelizmente, com a fragmentação do conhecimento, determinada pela especialização, perde-se a capacidade de interconectar o não conectado. Ou seja, perde-se criatividade “. Trecho do artigo, publicado em 2013, “Entre culturas, pesquisas, currículos e cotidianos: uma conversa com José Machado Pais”, que pode ser lido, na íntegra, AQUI.
“Nem o sistema educativo nem o mercado de trabalho parecem capazes de garantir a realização das aspirações de jovens. Com dificuldades de inserção profissional, são então acossados por sentimentos de desilusão e descrença, traídos na capacidade de imaginar um futuro com esperança. Há pais que fazem um forte investimento na formação acadêmica de seus filhos na expectativa de que possam mais facilmente encontrar trabalho e tornarem-se independentes. Mas o que se observa é que muitos deles permanecem em casa dos pais, sem trabalho, economicamente dependentes. De fato, embora os jovens integrem a chamada geração do futuro, muitos deles não o conseguem vislumbrar, arrastando-se num presente deficitário de esperança”. Trecho do artigo “A esperança em gerações de futuro sombrio”, publicado em 2012 pela Revista Estudos Avançados da USP, que pode ser lido na íntegra AQUI.
Fotos: Claudia Velho