A Geração Z na visão das Neurociências.
Identificação com os pares e cultura imediatista
O coordenador da Especialização em Neurociências Aplicada à Linguagem e à Aprendizagem da UCS, Lucas Fürstenau de Oliveira, doutor em Neurociências, aponta uma mudança fundamental, decorrente da influência da tecnologia, que demarca a transição geracional e seus desdobramentos. “Do ponto de vista biológico-evolutivo é comum que, em ambientes estáveis, os pais sejam a maior influência no desenvolvimento cognitivo e comportamental. Foi a situação do Século XX. Entretanto, o ritmo de mudanças nos últimos 15 anos, quando a Geração Z se desenvolveu, foi muito mais acelerado do que em décadas anteriores. Isso faz com que os pais não sejam mais o modelo a ser copiado, e sim os pares, as pessoas da mesma idade”, explica.
O acelerado ritmo de mudanças faz com que os pais não sejam mais o modelo a ser copiado.
Há, desse modo, três consequências visíveis: 1) o choque entre as visões de mundo das pessoas mais velhas (originárias de um ambiente estável) e das mais jovens (acostumados à transformação constante); 2) a formação de identidade própria do jovem pela observação e imitação dos pares, em vez de ser construída a partir da semelhança (ou oposição) aos pais; e 3) a flexibilidade cognitiva (acostumada à mudança, a Geração Z tende a estar mais preparada para ela).
Atenção parcial contínua – As relações digitais também geraram a necessidade de gerenciar fontes simultâneas de informação, o que, de acordo com Lucas, criou a ilusão de que o nativo digital é ‘multitarefa’. “A Geração Z cresceu exposta a estímulos variados ocorrendo simultaneamente – conversas paralelas, vídeo no YouTube, música ao fundo, redes sociais. O termo ‘atenção parcial continua’ foi cunhado para descrever este hábito. Mas é necessário distingui-lo de ‘executar tarefas simultâneas’. São coisas bem diferentes”, ressalva. Segundo ele, estudos mostram que os Z estão limitados a duas tarefas simultâneas, como quase todas as outras pessoas.
Ansiedade por recompensa – Outro elemento surgido da cultura digital (e que se relaciona à ansiedade verificada na Geração Z) é a expectativa de gratificação instantânea – que abrange adeptos frequentes de ambientes virtuais, independente de idade. “Como boa parte dos serviços de tecnologia permitem respostas instantâneas, o usuário acostumou-se a esperar o prazer da resposta imediatamente. O sujeito atribui mais valor ao prêmio imediato”, esclarece o professor. Assim, uma consequência do imediatismo é a redução da capacidade de lidar com o adiamento da recompensa, o que vai influenciar de relações pessoais a padrões de consumo.
“Aprender a esperar por uma recompensa é algo que contribui para o reforço dos circuitos pré-frontais, envolvidos no controle de impulsos. Não desenvolvê-los tende a ter, como consequência, uma diminuição da capacidade de se manter calmo e focado”, diz Lucas. “Isso pode deixar o sujeito menos hábil a desenvolver projetos de longo prazo, uma vez que a recompensa destes vêm com bastante atraso, e também torna mais difícil resistir a consumir algo. Na prática, aumenta o potencial para gasto financeiro descontrolado. Do ponto de vista de quem vende o produto, é ótimo; para o consumidor, nem tanto”.
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Texto: Ariel Rossi Griffante – argriffante@ucs.br
Fotos: Claudia Velho – cvelho@ucs.br