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Transtorno do humor ou bipolaridade?

Recentemente foi lançado a DSM- 5. É um manual para auxiliar o médico psiquiatra nos seus diagnósticos. Gerou muita polêmica pois parecia dizer que todos os seres humanos tem algum grau de transtorno psiquiátrico. Que poderíamos ter mais ou menos uma doença, mas que alguma coisa todos tínhamos. O ditado popular que dizia que "de médico e de louco todos têm um pouco" parecia ter sido confirmado pela comunidade científica. Certo? Não. Errado. Este manual é apenas uma referência para diagnóstico e é mais utilizado em pesquisas do que em clínica psiquiátrica. Porém, como a informação chega instantaneamente pelo doutor "Google", oferecendo a oportunidade para que todos sejam especialistas em qualquer área do conhecimento, estava disseminada a informação de doença coletiva que não poupa ninguém.

Um desses casos é a tal de bipolaridade. Todos se sentem bipolares, como os polos do globo ou de uma bateria de carro. Hoje estou muito triste, diz a moça. Hoje estou oscilando muito, para cima e para baixo, diz Antônio. Acho que sou bipolar, pois choro em qualquer filme... E assim seguem os sinais e sintomas que imitam o que foi lido no Google, Facebook ou numa daquelas mensagens que transbordam nossas caixas postais. Bom, isso não é bipolaridade e sim características de uma pessoa que tem emoções. Ponto. Ficar triste ou contente sempre foi normal e se assim não fosse poderíamos desconfiar de uma esquizofrenia.


O que existe de fato é um Transtorno do Humor. Doença séria com características hereditárias e que consiste numa alteração importante nos neurotransmissores cerebrais, portanto de origem orgânica. Ela pode ser apenas depressiva - episódio depressivo, ou eufórica - episódio maníaco. Se a pessoa tiver tido os dois tipos durante sua vida, chama-se de Transtorno Bipolar. Se os dois ocorrem simultaneamente, chama-se episódio misto. Também é cíclico, indo e vindo, até com certa uniformidade. Pode ser grave, com repercussões importantes sobre o cotidiano, tendo que ser tratado indefinidamente. Há medicamentos para prevenir os episódios de depressão e mania que chamamos de estabilizadores do humor, como o Carbonato de Lítio.

Ser depressivo não é estar apenas triste. É estar muito desanimado, pensando em coisas ruins e que a vida não vale a pena. Altera-se o sono e o apetite. Os cuidados consigo são desastrosos. Ser maníaco é estar eufórico. Muito animado, dormir pouco, gastar muito e fora do orçamento sem se dar conta do que está fazendo. Para ser Elvis Presley ou Obama é um passo, pois o cérebro não coordena mais a informação e o juízo crítico foi para o espaço. Um freia muito. O outro acelera demais. Os dois sofrem muito. Só que um quer morrer e só incomoda e o outro quer ser líder e se irrita com quem não concorda com sua exuberância. Pode durar bastante tempo. Trata-se com medicamentos, estabilizadores do humor e antipsicóticos, e muita orientação, sempre extensiva à família que nem sempre entende o que está ocorrendo.

Carlos Gomes Ritter
Professor de Psiquiatria no Centro de Ciências da Saúde



Revista UCS - Publicação da Universidade de Caxias do Sul, de caráter jornalístico para divulgação das ações e finalidades institucionais, aprofundando os temas que mobilizam a comunidade acadêmica e evidenciam o papel de uma Instituição de Ensino Superior.

O texto acima está publicado na décima edição da Revista UCS que já está sendo distribuída nos campi e núcleos.

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