"A tendência é analisar como os fatores mercadológicos (marca, preço...), associados a fatores sociais e culturais disparam determinados estímulos neurais influenciando a disposição de compra"
O que motiva a compra de um produto ou serviço é algo complexo de se compreender. Pesquisas atuais apontam que mais de 85% das decisões de compra ocorrem em dimensões subconscientes e inconscientes da nossa mente, e são diretamente influenciadas por estímulos mercadológicos, que vão desde a marca até a informação de preço do produto. Isto é, nossas decisões de compra são mais irracionais do que racionais. E é por isso que grandes empresas têm se subsidiado de equipes multidisciplinares, compostas por médicos, psicólogos, sociólogos, antropólogos e biólogos, envolvendo uma gama de novas áreas (além das atualmente envolvidas, como Administração e Comunicação), para tentar desvendar conjuntamente o que chamamos de Comportamento do Consumidor.
Esse movimento originou conceitos como Neuromarketing - o uso da Neurociência aplicada ao Marketing - e, mais recentemente o uso da biologia evolutiva, etologia e os efeitos psicobiológicos ao Marketing. A tendência é analisar como os estímulos mercadológicos, associados aos estímulos sociais e culturais, disparam determinados estímulos neurais influenciando a disposição de compra. Se essa ideia da compra irracional ainda soa estranha, é porque normalmente não notamos quando e como isso acontece.
Pense na compra de um HD externo para backup, uma decisão que parece bastante racional. Qual é o motivo principal para comprar esse produto? Não é o medo de perder toda a informação? Existe muito medo disso. Pavor. Imagine perder todas as fotos, lembranças, anos de registros e documentos. Pois é, nem passa pela nossa cabeça dizer tudo isso ao vendedor no ato de compra, apesar de ser o que a impulsiona. E é por isso que, provavelmente, o HD que será comprado é o que mais agradar no quesito segurança. Ele pode ter um excelente design e ter mil e um recursos, mas se não aparentar ser seguro, se a carcaça externa parecer frágil, não irá interessar ao consumidor.
Essa perspectiva muda tudo do ponto de vista mercadológico, pois não podemos mais simplesmente perguntar (diretamente) para o consumidor o que ele quer comprar e o porquê, achando que vamos obter todas as respostas. Isso ocorre pois os elementos irracionais têm por base dimensões de status, aceitação social, prazer, medo, entre outros aspectos, os quais pesam muito mais na nossa decisão do que os elementos racionais. São nossos desejos mais profundos e instintivos, e que não podem, portanto, ser mapeados apenas de forma superficial, como ao responder um questionário de pesquisa. E é nesse momento que as abordagens como Neuromarketing entram em cena.
Outro exemplo, que demonstra esse fenômeno, é o fascínio que crianças têm por cereais ou chocolates que vêm com um brinquedo. O desejo é racional ou é pelo brinquedo em si? Sabe-se hoje que esse comportamento se dá em função do efeito do descobrimento e do mistério; da sensação que a criança tem ao ter sua curiosidade saciada ao achar o brinquedo pela primeira vez, quando abre o pacote. Uma caça ao tesouro, um arquétipo infantil. Por isso, não importa o brinquedo, importa a descoberta, pois logo o objeto será descartado. E esse é o efeito do inconsciente, muito mais profundo, e é o que define a compra. Essa perspectiva muda toda a Estratégia de Marketing, da concepção do brinde até a embalagem. O ponto é que essa informação decisiva não se descobre apenas perguntando para a mãe da criança, muito menos para a criança.
Portanto, com o avanço dessas metodologias e tecnologias neurocientíficas, podemos imaginar que teremos daqui para frente um mapa cada vez mais completo dos nossos gatilhos de compra, nas diversas situações de consumo que vivenciamos, e com base em nosso subconsciente e inconsciente. Mas, nesse quadro, fica a seguinte pergunta para reflexão: Quais serão as implicações desse conhecimento e da forma como ele poderá ser utilizado, em nossa sociedade?
Mateus Panizzon, doutorando em Administração na Linha de Gestão da Inovação (PUCRS/UCS), professor na Área de Administração.
Revista UCS - Publicação mensal da Universidade de Caxias do Sul, de caráter jornalístico para divulgação das ações e finalidades institucionais, aprofundando os temas que mobilizam a comunidade acadêmica e evidenciam o papel de uma Instituição de Ensino Superior.
O texto acima está publicado na segunda edição da Revista UCS que já está sendo distribuída nos campi e núcleos.