Projeto realizado no Instituto de Biotecnologia da Universidade de Caxias do Sul, em conjunto com Instituição de Ensino Superior da França, visa a desenvolver novos medicamentos para a epilepsia.
Aliviar sintomas, diminuir a dor, prevenir ou curar as doenças e, até mesmo, salvar vidas. Essas são algumas das principais funções dos medicamentos. A maioria das pessoas - mesmo aquelas que não apresentam patologias crônicas -, vez ou outra, fazem uso de um analgésico ou de um anti-inflamatório, para citar os mais comuns. Hoje, é possível se afirmar que os medicamentos são uma das causas da longevidade e qualidade de vida da população. Frequentemente surgem novas drogas, graças à eficácia da ciência.
Dos experimentos iniciais para a criação de um novo medicamento até sua chegada às prateleiras das farmácias, são necessários anos, talvez décadas. No Instituto de Biotecnologia do Centro de Ciências Agrárias e Biológicas, os primeiros passos para o "nascimento" de um novo medicamento estão sendo dados. Trata-se das ações do projeto "Novos compostos organometálicos, uma visão terapêutica - fármacos em potencial", realizado em conjunto com a Universidade Paris Sud-XI.
O objetivo do projeto é pesquisar novos medicamentos capazes de melhorar a vida de quem sofre com a epilepsia, doença que causa desordens neurológicas caracterizadas por descargas elétricas anormais dos neurônios, que podem gerar convulsões. O projeto, coordenado pelo professor do Centro de Ciências Exatas e Tecnologia e do Programa de Pós-graduação em Biotecnologia Sidnei Moura e Silva, busca o desenvolvimento de novos compostos organometálicos - ou seja, por meio da química bioinorgânica - com aplicações farmacológicas. "O nosso projeto busca compreender os mecanismos relacionados à ação dessas possíveis novas drogas. O princípio será a união de moléculas orgânicas e alguns derivados com atividades medicinais já conhecidas, com metais de transição, e, a partir disso, produzir complexos organometálicos, os quais serão avaliados quanto às possíveis atividades farmacológicas bem como toxicológicas", explica o professor Sidnei (na foto da página ao lado, o último à direita).
Dentre os primeiros complexos estudados no projeto, estão os derivados de alguns fármacos clássicos usados na medicina como antiepilético (a exemplo do ácido valproico), ligados a metais de transição (que possuem alta capacidade de potencializar atividades dessas moléculas). "Por consequência, a primeira ação a ser testada desses novos protótipos será a de redução da atividade epilética", relata o professor, apontando que a pesquisa está na fase inicial. "Prevemos que as primeiras estruturas químicas dos compostos sintentizados serão elucidadas durante os próximos meses. Posterior a isso, os testes de atividade e toxicidade iniciarão em paralelo aqui e na França", enfatiza. Participam da pesquisa, atualmente, seis professores e cinco bolsistas (um de doutorado, dois de mestrado e dois de Iniciação Científica). Na UCS, o projeto ocorre no Laboratório de Biotecnologia de Produtos Naturais e Sintéticos e no Laboratório de Genômica, Proteômica e Reparo de DNA, do Instituto de Biotecnologia, ligados ao Programa de Pós-graduação em Biotecnologia; e no Laboratório de Caracterização de Materiais, do Centro de Ciências Exatas e Tecnologia, ligado ao Programa de Pós-graduação em Materiais. Também faz parte do projeto, além da Universidade Paris Sud-XI, a Universidade Federal do Rio Grande do Sul.
Paulo Roberto dos Santos (foto acima), mestrando em Biotecnologia e bolsista CNPq, é um dos integrantes do projeto. A sua rotina consiste no cumprimento do cronograma do projeto de pesquisa, que é direcionada para a síntese, identificação química e realização de ensaios biológicos de toxicidade dos compostos organometálicos. "Paralelamente, realizo coorientação de dois estudantes de Iniciação Científica, os quais auxiliam nas atividades laborais do projeto, como síntese e recuperação de complexos metálicos, pesquisa bibliográfica e organização do laboratório", relata. Para ele, estar envolvido nesse projeto é muito importante. "A pesquisa dessa classe de medicamentos é instigante, pelo fato da epilepsia e as crises convulsivas serem patologias que afligem uma parcela significativa da população e por existirem opções restritas de tratamento. O desenvolvimento de uma classe de fármacos mais potentes e menos agressivos possibilitaria acréscimo à qualidade de vida ao doente", destaca.
Segundo o professor Sidnei Moura e Silva, a importância dos compostos organometálicos pode ser indicada pela sua presença em todos os organismos vivos. O mais conhecido composto organometálico natural é a vitamina B12, uma porfirina (tipo de molécula) contendo um átomo de cobalto, utilizada em várias transformações enzimáticas. Essas moléculas pertencem a uma família ampla e com características versáteis, as quais apresentam uma gama de potenciais aplicações.
Baseada nessas propriedades características, uma nova área de pesquisa em química medicinal tem sido desenvolvida. Gerard Jaouen foi o primeiro a introduzir o conceito de "química biorganometálica" em 1985, embora o primeiro composto organometálico utilizado na terapêutica foi o Salvarsan (um antissifílico utilizado a partir de 1910) descoberto por Paul Ehrlich.
Quando se pensa em fármacos, normalmente, a primeira ideia que surge é a de compostos orgânicos, descobertos como princípios ativos ou sintetizados em laboratório. No entanto, vários compostos ditos inorgânicos e que contêm metais são usados na clínica médica.
O projeto "Novos compostos organometálicos, uma visão terapêuticafármacos em potencial" ocorre por meio de uma colaboração internacional entre a UCS e a Universidade Paris Sud-XI. O projeto, que teve início no começo de 2013, tem duração de três anos e possui apoio da Capes - edital Programa Pesquisador Visitante Especial -, ligado ao programa governamental Ciência sem Fronteiras. O objetivo desse edital é promover a interação entre universidades e grupos de pesquisa nacionais com pesquisadores renomados de fora do Brasil. Foi dessa forma que a pesquisadora Françoise Dumas veio à UCS em abril deste ano, quando permaneceu por um mês com os pesquisadores do Instituto de Biotecnologia. Na sua estada no Brasil, realizou ainda palestras em universidades gaúchas e paulistas. Na UCS, participou do dia a dia no Laboratório de Produtos Naturais e Sintéticos, planejando e executando experimentos.
"É muito importante dividir experiências entre a UCS e a minha universidade, porque nós nos beneficiamos com as diferenças de ensino. Em alguns aspectos, as organizações são parecidas, e isso permite uma melhor colaboração", relata a pesquisadora, que também fez elogios à estrutura de laboratórios do Instituto de Biotecnologia. A troca de experiências continua com a ida, a cada seis meses, de estudantes do curso de Doutorado em Biotecnologia da UCS para a Universidade Paris Sud-XI, em Chatenay-Malabry, na França.
"A cooperação internacional é uma estratégia científica altamente produtiva, pois permite o intercâmbio de alunos e professores, a difusão do conhecimento por meio de palestras, conferências e congressos, além da transferência de conhecimento científico e tecnológico entre os países envolvidos", avalia o professor Sidnei Moura e Silva. Ele afirma que o projeto atual pretende consolidar o intercâmbio entre os grupos. "Esse projeto reflete a experiência prévia dos grupos participantes, o que é uma garantia da viabilidade do trabalho e da excelência do conhecimento científico gerado. A interação dos laboratórios envolvidos possibilitará consolidar a rede de pesquisa dentro de tema de interesse comum. Espera-se que a troca de experiências metodológicas e conceituais entre os grupos permita catalisar o processo de formação de pessoas e um salto qualitativo no impacto da produção científica", enfatiza.
(Texto: Juliana Rossa)
O projeto "Novos compostos organometálicos, uma visão terapêutica - fármacos em potencial" integra as ações do Núcleo de Inovação e Desenvolvimento de Produtos Naturais e Sintéticos da Universidade, que é um dos 19 NIDs da UCS.
Revista UCS - Publicação da Universidade de Caxias do Sul, de caráter jornalístico para divulgação das ações e finalidades institucionais, aprofundando os temas que mobilizam a comunidade acadêmica e evidenciam o papel de uma Instituição de Ensino Superior.
O texto acima está publicado na quarta edição da Revista UCS que já está sendo distribuída nos campi e núcleos.