Institucional

Incentivo à cultura empreendedora

Novembro é o mês em que tradicionalmente ocorre a Semana Global de Empreendedorismo. O evento, desde 2007, mobiliza milhões de pessoas em 131 países para o incentivo da cultura empreendedora. Não é preciso ir longe, porém, para perceber sua importância: Caxias do Sul, segundo maior polo metalmecânico do Brasil e uma das cidades com renda per capita mais elevada do país, registra hoje uma empresa para cada dez habitantes, de acordo com dados do Sebrae.

Os preceitos do liberalismo clássico dos filósofos John Locke e Adam Smith são categóricos: a busca pelo crescimento individual contribui diretamente para o crescimento coletivo. Esse pensamento já é parte da realidade caxiense, mas a continuidade desse processo depende das novas gerações. Por isso, a Universidade de Caxias do Sul também empreende para formar novos empreendedores na região.

Programa de Empreendedorismo

Alunos de diversos cursos da UCS já estão familiarizados com a disciplina de Empreendedorismo em seus currículos específicos. A partir de 2014, contudo, essa disciplina estará disponível para todos os acadêmicos. Uma das responsáveis pelo seu desenvolvimento e extensão é Eloide Pavoni, coordenadora do Programa de Empreendedorismo da UCS.

O programa existe há mais de dez anos e se dedica a levar os acadêmicos que possuem iniciativas empreendedoras ao mercado. A disciplina é o primeiro passo desse caminho. "Decidimos trabalhar uma nova metodologia e mesclar áreas do conhecimento dentro de uma mesma turma. A partir dessa variedade, surgem mais possibilidades criativas", ressalta Eloide, acrescentando que os professores passarão por um processo de qualificação para ministrar a disciplina.

Criatividade é o termo-chave da nova metodologia. Eloide revela que o formato atinge até mesmo o estudante que, em princípio, não pretenda montar seu próprio negócio. "Tu podes estar em uma organização que não é a tua própria, e ser um intraempreendedor. É sempre preciso ter iniciativa, sempre pensar em fazer as coisas de forma diferente. O objetivo é formar profissionais com esse perfil. Empreender é ser criativo, ter ideias".

Os acadêmicos que já passaram pelo modelo antigo devem se lembrar da elaboração do plano de negócios, projeto final da disciplina. Com o foco na criatividade, o plano ficará no passado. "No plano de negócios tu podes encontrar alguém pra fazer depois, isso é fácil. Agora, ter uma ideia legal, trabalhá-la de forma criativa, isso não", conclui Eloide.

Juliana Luchesi, professora no curso de Administração e parte do primeiro "time" qualificado para ministrar a disciplina, analisa a matéria como um momento de ruptura na vida do estudante. "É aqui que o aluno pode se dar conta de suas competências, é quando ele pode se descobrir", explica. A docente também concorda com as mudanças metodológicas no que dizem respeito às turmas multidisciplinares. "No momento em que temos engenheiros, administradores, jornalistas ou nutricionistas em uma mesma sala de aula, essas equipes mistas fazem borbulhar ideias. Há uma complementaridade de perfis em função da diversidade". Ela também ecoa a importância do empreendedorismo mesmo para quem não deseja ser chefe. Um dos focos da disciplina é desenvolver as habilidades de intraempreendedor, daquela pessoa que tem competência de líder, mas que não quer sair do ambiente organizacional onde está. "Ele é parte ativa do processo de desenvolvimento de uma empresa já formada, e hoje as organizações estão desesperadas por esse tipo de profissional", ressalta.

Eloide comenta que a parte da demanda por essa mudança veio do Centro de Ciências da Comunicação, por parte dos professores Marcell Bocchese e Zildomar Oliveira. Incentivador das práticas empreendedoras, Oliveira ajudou na implementação da disciplina no currículo dos cursos de Comunicação. Ele esclarece que a intenção, desde o início, era fazer o aluno refletir sobre outras possibilidades que não necessariamente trabalhar em uma redação de jornal ou TV, no que diz respeito aos estudantes de Jornalismo, por exemplo. "As novas tecnologias trazem outras possibilidades. Para os alunos de Publicidade e Propaganda e de Fotografia, é de certa forma até mais fácil ser empreendedor. Eles podem criar uma agência, um estúdio de fotografia. Para o jornalista e para o relações públicas, ao contrário, é preciso um planejamento bem mais cuidadoso", afirma.

Incentivo empreendedor

Para o professor, o projeto tem dado resultados. Ele cita duas egressas do curso de Jornalismo que hoje são proprietárias de uma empresa de análise de mídias sociais. "Posso estar sendo otimista, mas acredito que se a cultura empreendedora não tivesse sido mostrada aos poucos no curso, elas talvez não tivessem a empresa hoje", completa. Oliveira, porém, reconhece que diversos cursos, em especial os da área de Ciências Humanas, terão dificuldade para absorver a cultura empreendedora. Isso principalmente pelo fato de as competências das áreas humanas não estarem ligadas a cadeias produtivas, como as engenharias ou cursos de informática. "A área de comunicação, por exemplo, cultural e historicamente, está mais ligada a serviços. Nas aulas, a maioria dos planos de negócios sempre é de lojas, franquias. Poucos envolvem fábricas e processos", admite. A restrição nas áreas de atuação, contudo, não chega a ser um impedimento para o pensamento empreendedor. "A ideia é inserir o 'vírus' no sujeito, para que talvez daqui a dez, vinte anos, quando surgir algum tipo de oportunidade, ele pense na possibilidade de ser o empreendedor."

A área das humanas não é a única a sofrer com a falta de cultura empreendedora. Pode parecer estranho, mas esse sentimento também é compartilhado pela Administração. "O acadêmico que se formava em Administração tinha como objetivo de vida ser um funcionário público ou crescer ao longo de décadas dentro de uma empresa. Hoje existe uma liberdade maior de possibilidades, de escolhas. A vantagem dos egressos do curso é o generalismo, o domínio de diversas áreas, como marketing, finanças e gestão de pessoas", avalia a professora Juliana Luchesi.

Ao mesmo tempo em que existe a consciência sobre a importância do incentivo à mentalidade empreendedora, o Programa de Empreendedorismo da UCS também entende que a unificação da disciplina pouco importa, se não houver base para que o aluno siga adiante com seus projetos. "O estudante terminou a disciplina, teve ideias interessantes, mas e agora? Estamos pensando em várias formas de dar suporte para esse aluno. Amadurecer a ideia, entender como funcionaria o cliente, entender o mercado. Até mesmo apresentar esse projeto para investidores", projeta Eloide.

Por que empreender?

A questão do empreendedor, da iniciativa privada e da livre concorrência já foi exaustivamente debatida por filósofos, sociólogos e economistas. Apesar disso, por vezes é difícil avaliar o impacto desses modelos na prática. A bolha imobiliária dos EUA, que desencadeou a crise econômica mundial em 2009 - e que ainda ressoa nos países desenvolvidos - , ajudou a colocar em xeque a visão utópica do sonho neoliberal.

Mas para Juliana Luchesi, o fator empreendedor relaciona-se até mesmo com os laços sociais: "Onde existe uma empresa, existe desenvolvimento ao redor dela, seja na cadeia produtiva, com fornecedores e prestadores de serviço, seja com funcionários, e/ou com a família dos funcionários. Esse enlace é fantástico. É uma questão de vínculos sociais. O que se gera em termos de cinturão é importante, porque ele começa a criar identidade naquele lugar. E é este o papel forte da universidade: formar esse perfil empreendedor."

Zildomar de Oliveira destaca a importância do empreendedorismo na Serra gaúcha: "A nossa região é rica não porque somos mais inteligentes, mas porque herdamos uma cultura empreendedora dos italianos e alemães, que vieram de uma Europa já desenvolvida." E para ele, essa cultura não está presente apenas no que diz respeito ao polo metal-mecânico. "A área de serviços está muito aberta. Ser empreendedor não significa ter uma empresa de 100 funcionários. Ser empreendedor pode significar trabalhar dentro de casa, como freelancer", conceitua.

A história de Fernanda

Já é possível rastrear alguns dos frutos das iniciativas empreendedoras na Universidade - em especial graças à disciplina de Empreendedorismo. Fernanda Prado, aluna de Publicidade e Propaganda, foi uma das "contaminadas" pelo "vírus" empreendedor. Ela conta que começou a se apaixonar pelo processo nas aulas do professor Zildomar Oliveira, em especial depois de entrevistar empreendedores para um trabalho de aula.

Durante a elaboração do plano de negócios, seu destino foi selado. Ela e o seu marido, que é motoboy, resolveram abrir uma empresa de coletas e entregas. "Investimos em cartões de visitas, criamos uma página no Facebook e encaminhamos e-mails para todos os conhecidos, disponibilizando o serviço", conta Fernanda. Foi então que Oliveira trouxe para a aula uma ex-aluna que também passava por uma situação semelhante dos aspectos jurídicos da criação de uma empresa. "Registrei a empresa, tirei alvará, fiz talão de notas. Hoje já estamos comprando mais uma moto, e planejando a compra de uma caminhonete para o ano que vem", comemora.

Apesar de atuar em uma área distante de sua graduação acadêmica, Fernanda acha que ela vai ser importante para o futuro da empresa: "O curso de Publicidade auxilia na questão gráfica, onde desenvolvemos a 'cara' da empresa, nos ensinamentos de como cuidar e manter os nossos clientes, como conhecê-los e as suas necessidades". Para ela, nada disso teria sido possível sem a disciplina. "Casou com o nosso grande desejo e o momento foi oportuníssimo", finaliza.


Inovação

A importância do empreendedorismo pode estar clara, mas o que de fato caracteriza o perfil empreendedor ainda é motivo de discussão. Para Eloide Pavoni, ele deveria ser antes de qualquer coisa um inovador. "Aqui na cidade, muitas vezes, o empreendedor é visto apenas como aquele que monta um negócio, sem inovação nenhuma. Vemos pelas próprias ideias dos alunos na sala de aula. Supermercado, posto de gasolina... Ainda é difícil tirar as pessoas da zona de conforto. A ideia é: o que eu posso fazer de diferente em relação ao que já existe? Se lançarmos esses desafios, se mostrarmos ao aluno onde ele pode chegar com ideias inovadoras, talvez consigamos uma geração com um diferencial", conclui.

Rede de ferramentas

Um dos recursos mais eficientes oferecidos pela UCS, quanto ao desenvolvimento empresarial da região, já está bem-estabelecido há mais de dez anos: é a Empresa Júnior. Daniela Tomazzoni, acadêmica do sexto semestre de Administração, explica que a organização sem fins lucrativos oferece serviços de consultoria empresarial nas áreas de marketing, finanças e gestão de pessoas para micro e pequenos empresários: "Fazemos pesquisas de mercado, elaboração de fluxo de caixa e análise de investimentos. Normalmente, quem nos procura é aquele que não sabe como organizar a estrutura de sua empresa. Educamos esse empreendedor."

As vantagens do programa são uma "via de mão dupla". Se, por um lado, o auxílio à comunidade é claro (Daniela cita como exemplo uma escola de idiomas que, após obter consultoria, mudou de endereço e viu seu número de alunos duplicar de 150 para 300), o crescimento acadêmico para o aluno também é inegável. "Na Revista Exame de outubro, o modelo de Empresa Júnior ficou em primeiro lugar para atividades extraclasse, que auxiliam a colocação no mercado. Aqui os alunos têm toda a experiência que eles não teriam em um estágio, como liderar equipes, organizar reuniões, formular contratos. Além dos contatos que são feitos aqui dentro", conclui Daniela. A UCS Empresa Júnior é composta de equipes multidisciplinares, e o projeto está espalhado na maioria dos campi e núcleos da Instituição.

Outra ferramenta de apoio mútuo, tanto para o empreendedor quanto para o acadêmico, é o Núcleo de Apoio Contábil e Fiscal (NAF). Criado em março deste ano, o NAF, composto por alunos do curso de Ciências Contábeis, oferece atendimento para a comunidade em geral que procura esclarecer questões referentes à Receita Federal, impostos, instituições fiscais e legislação da área. Por um lado, o suporte gratuito da UCS ajuda no desenvolvimento de microempresas e, por outro, força o aluno voluntário do programa a pesquisar os tópicos que lhe são questionados, contribuindo também para o aumento de sua bagagem acadêmica - sem esquecer, é claro, do "peso" no currículo.

Mas o apoio não é restrito à noção em gerenciamento. Parceria entre o Poder Público Municipal e empresas prevê a implantação do TecnoUCS, um polo de inovações tecnológicas e empreendedoras, que ocupará uma área na Cidade Universitária, em Caxias do Sul. Enquanto isso, um projeto semelhante em menor escala já existe: a Incubadora Tecnológica de Caxias do Sul (Itec). A Itec é um programa de incentivo e apoio ao surgimento de empresas de tecnologia na região. Ela funciona há 14 anos e já colaborou com o surgimento de 39 empresas.

(Texto: Pedro Rech, estagiário de Jornalismo do Frispit Portal - Agência Experimental de Comunicação; Fotos: Hugo Araujo)



Revista UCS - Publicação da Universidade de Caxias do Sul, de caráter jornalístico para divulgação das ações e finalidades institucionais, aprofundando os temas que mobilizam a comunidade acadêmica e evidenciam o papel de uma Instituição de Ensino Superior.

O texto acima está publicado na sétima edição da Revista UCS que já está sendo distribuída nos campi e núcleos.

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