Estudo relaciona índices de poluição do ar dentro e fora de casa com a presença de doenças respiratórias.

Em casa, na escola, na rua, em ambientes fechados ou ao ar livre, todos estamos suscetíveis à poluição atmosférica e, por consequência, a doenças respiratórias como asma e bronquite. Contato com fumantes, alergias e exposição a vírus e bactérias são alguns dos fatores que contribuem para provocar ou comprometer esse quadro, principalmente entre crianças.

Apesar de diversos estudos já constatarem prejuízos à capacidade respiratória dos pequenos expostos ao ar poluído, nenhum estudo com medidas de exposição até o momento investigou o efeito da poluição sobre as doenças respiratórias das crianças em Caxias do Sul. É com esse propósito que uma equipe de alunos, tutores e preceptores do PET SAÚDE – Programa de Educação pelo Trabalho para a Saúde (dos Ministérios da Saúde e da Educação), em parceria com o Centro de Ciências da Saúde -através dos cursos de Enfermagem e Medicina- e a Secretaria Municipal da Saúde, desenvolve o estudo "Efeitos da Poluição Intra e Extradomiciliar sobre Sintomas Respiratórios e Marcadores Pulmonares na Infância". O trabalho faz parte de um consórcio de investigadores brasileiros interessados em detectar os marcadores de poluição e seu impacto na saúde infantil.

Realizado desde o mês de setembro, o estudo envolve um total de 80 crianças, com idade entre cinco e 12 anos. Metade delas reside no bairro Fátima Baixo, à margem da rodovia RS-122, considerada uma área de alta exposição à poluição. Já as outras 40 vivem no Fátima Alto, caracterizado pela coordenação do trabalho como área de baixa exposição a poluentes. O professor do curso de Medicina, Emerson Rodrigues da Silva, responsável pelos exames e avaliações das crianças, explica que o resultado do estudo permitirá a elaboração de campanhas de saúde pública, visando minimizar a emissão desses gases tóxicos e gerar políticas de redução dos danos junto às comunidades mais afetadas. "Tanto o ambiente interno quanto o externo contribuem para o desenvolvimento das doenças respiratórias. De um lado, as crianças ficam expostas à poluição extradomiciliar, relacionada à produção industrial e à emissão de poluentes dos veículos. Do outro, a intradomiciliar, cuja principal fonte é a fumaça proveniente do tabaco, mas que pode advir também de aquecedores, estufas a gás, fogões a lenha e lareiras (a chamada queima de biomassa)", explica Emerson.

Durante um mês, os acadêmicos visitam as moradias cadastradas e fazem o acompanhamento. Filtros dentro de pequenos tubos são agrupados em cabides, que permanecem suspensos nas casas durante cerca de 30 dias –preferencialmente em um local onde a família passa a maior parte do tempo. As crianças que frequentam a escola recebem mais três filtros, que ficam presos à mochila- cuja função é medir a poluição que é inalada fora de casa. Outros métodos usados são a aplicação de questionários e a coleta de escarro (para análise da quantidade de carbono negro). "Todas essas medidas serão realizadas até o final do ano, a fim de avaliar a influência das variações de temperatura e clima nas doenças", complementa Emerson.


Parceria para pesquisas em poluição e saúde da criança
O estudo de Caxias do Sul está sendo conduzido simultaneamente em São Paulo, em uma parceria dos pesquisadores da UCS com o Laboratório de Poluição Atmosférica do Departamento de Patologia da USP, que é o principal grupo de pesquisa de poluição do ar atualmente no Brasil. A comparação e a análise conjunta dos dados permitirá conhecer melhor as fontes da poluição da cidade de Caxias do Sul e a real importância delas para a doença respiratória das crianças. Este painel de informações servirá também de base para estudos futuros mais específicos e para a ampliação da rede de pesquisa em poluição e saúde infantil. "A ideia é que com boas parcerias tenhamos uma linha de pesquisa em saúde ambiental pediátrica na UCS, avaliando permanentemente os efeitos não só da poluição do ar, mas também os efeitos de metais pesados como chumbo, por exemplo, sobre a saúde das crianças", completa o professor Emerson.

Nas fotos, o professor Emerson Rodrigues da Silva, responsável pelos exames e avaliações, feitos a partir da coleta de material em filtros fixados em moradias ds bairros Fátima Baixo e Alto. Os filtros são colocados dentro de tubos, que permanecem suspensos em cabides nas casas para a medição da poluição.

A poluição e as doenças respiratórias
A exposição à poluição do ar tem sido associada à redução da função pulmonar e ao consequente aumento das taxas de internação. O professor Emerson Rodrigues da Silva explica que as crianças apresentam maior consumo de oxigênio por quilo de peso do que os adultos. "Isso faz com que qualquer agente químico na atmosfera atinja proporcionalmente mais as vias respiratórias de uma criança do que as de um adulto, num mesmo período de tempo", revela. Emerson analisa ainda que o impacto das doenças respiratórias infantis é muito expressivo no Rio Grande do Sul, onde mais de 20% da população apresenta sintomas compatíveis com asma.

Apesar da quantidade de publicações internacionais e algumas nacionais sobre o grande avanço de fontes poluidoras em áreas urbanas, há poucos dados brasileiros, e mais ainda, poucas informações sobre o impacto dessas fontes na saúde de crianças no Estado. A cidade de Caxias do Sul serve de bom modelo para se estudar estas variáveis pelo importante avanço da atividade industrial, com alto potencial poluidor tanto na produção como no escoamento. "Poucos estudos até hoje deram a devida importância à verificação do impacto de diversas fontes poluidoras nos sintomas respiratórios e no desenvolvimento pulmonar das crianças. O estudo que propomos é inédito no Brasil, não só porque se utilizará da detecção objetiva de agentes poluidores, mas também porque irá medir a quantidade de carbono negro dentro de células que ficam no trato respiratório. Isso nos dará a quantidade de poluição efetivamente inalada pela criança, completa.

Os efeitos do tabagismo
A fumaça proveniente do tabaco é o principal poluente verificado em ambientes fechados. Segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS), o tabagismo passivo constitui um risco adicional à saúde da criança. A OMS estima que pelo menos 700 milhões de crianças, ou seja, quase metade das crianças do mundo, respirem ar poluído pela fumaça do tabaco em suas próprias casas. Crianças mais jovens, filhas de fumantes, são particularmente vulneráveis aos efeitos negativos da fumaça do cigarro e também as mais expostas, em geral por permanecerem períodos mais prolongados em ambientes fechados na companhia de fumantes. O tabagismo passivo está associado ao aparecimento e agravo de um grande número de sintomas e doenças respiratórias como tosse, catarro, chiado, rinite, asma e infecções de vias aéreas superiores, como otite média e sinusite e de vias aéreas inferiores como pneumonia, bronquite e bronquiolite.

Fotos: Daiane Nardino, Isabella Vidor e Tamara Bavaresco.